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Líder, que tal transformar seus Headcounts em Heartcounts?

Em tradução direta, Headcount significa contar cabeças. Sempre que ouço essa palavra me lembro das excursões do colégio. Antes de entrar no ônibus fazíamos uma fila indiana*, colocando sempre a mão no ombro do coleguinha à frente e nos mantínhamos incólumes. Logo em seguida, a professora passava ao nosso lado, batendo levemente na cabeça de cada um, com sua palma da mão aberta, contando alto: um, dois, três… Cada cabeça, um aluno.

Mais tarde, o mundo corporativo me ensinaria que esse indicador também trataria colaboradores como cabeças.

Cada cabeça um recurso. O termo se tornou comum no mundo corporativo e parece até ser mais elegante perguntar para um líder quantos headcounts ele “tem” do que quantos funcionários ele gerencia. Interessante notar o “ter” headcounts. O que mostra a necessidade de posse, propriedade.

A ideia de ter muitos headcounts passou a demonstrar a relevância de uma área ou mesmo o poder de um gestor. Quanto mais cabeças, mais relevante uma equipe é. Mas será que esse conceito ainda faz sentido nos dias atuais? Ter tantas “cabeças” realmente significa que uma equipe é mais importante, ou um líder mais “poderoso”? Seria esse um artefato de alimentação do ego de líderes que precisam disso para compensar suas dificuldades em se relacionar com pessoas?

Ao invés de Headcounts. Pensemos em ter Heartcounts.

Vejo que a maioria das empresas e equipes em que os resultados são incríveis há uma coincidência enorme (contém ironia). As pessoas realmente se sentem emocionalmente engajadas com a filosofia de atuação da empresa e a do líder que as gerenciam. Mais do que isso, as pessoas são elas mesmas. Já parou para pensar que quando pedimos para que as pessoas “performem”, estamos pedindo para que elas não sejam elas mesmas?

No teatro, atores e atrizes praticam uma performance, ou seja, assumem um papel, incorporam uma personagem. Ao cair das cortinas, elas voltam a ser quem são. No mundo corporativo passamos a pedir para que as pessoas performem assim que passem seus crachás pela catraca. Depois que deixam a empresa, elas podem voltar a ser quem são.

Enquanto estão dentro da empresa são headcounts, fora, podem voltar a ser heartcounts.

Quando pedimos para que líderes e colaboradores atuem racionalmente, estamos valorizando o headcount e não o heartcount. Quando pedimos para que cumpram um papel e responsabilidade, também. Quando dizemos “não é nada pessoal, mas vou te demitir”, estamos assumindo que a geração de resultado é mais importante do que as relações humanas. Quando digo que o “cliente está certo, mas a política interna não deixa fazer”, estamos privilegiando o processo e não o ser humano.

Políticas internas existem para servir às pessoas ou as pessoas existem para servir às políticas?  

Todos os dias converso com empresas que possuem problemas de liderança. O principal deles? Promoveram funcionários que eram excelentes “performers”, mas que não sabem nada de relações humanas. Não estão prontos para gerenciar pessoas pois dedicaram a maior parte da suas vidas para a geração de resultados. Foram tratados como headcounts, e agora, precisam virar a chave e gerenciar heartcounts. Ficam desesperados. Não há fórmula mágica. Leva tempo. É preciso reprogramar o circuito para que a cabeça deixe o coração atuar.

Ao entrar em algumas empresas vejo pessoas sisudas, que não sorriem. O silêncio impera pelas baias. Poucas conversam. Estão produzindo. São máquinas. Algumas vestem uma armadura corporativa que leva o nome de “dress code”. Se pudessem, tirariam a gravata ou o vestido e usariam um jeans e uma camiseta. Trabalhariam melhor. A justificativa que mais ouvimos é que a cultura da empresa é assim. Na verdade, a cultura da empresa é tratar os colaboradores como headcounts.

A melhor forma de identificar se sua empresa valoriza mais os headcounts do que heartcounts é observar a postura de quem entra no elevador contigo. Já parou para analisar como alguns elevadores de empresas são? Pessoas que não se conhecem, mas trabalham na mesma empresa mal se cumprimentam. Entram em silêncio. Não se entreolham. Saem em silêncio. Mas alguns líderes dizem que tudo ali é uma família. Família de Headcounts.

Em outras, o elevador é barulhento. Pessoas falam sem medo de serem julgadas. Falam sobre o trabalho mas também de suas vidas pessoais. Não estão performando. São elas mesmas ali. Tem cólicas, pedras no rim, às vezes problemas financeiros. Também se separam dos cônjuges e seus filhos nem sempre vão bem na escola. São de carne e osso.

Não há mais espaço, no mundo corporativo, para líderes e empresas que batem a palma da mão na cabeça de seus colaboradores e contam números. É preciso olhar para dentro de cada um deles e enxergar que ali bate um coração louco para se apaixonar por uma causa. Louco para ser acelerado por um desafio. Um coração que quer ser validado, envolvido, inundado de adrenalina por aprender algo novo. Triste o líder com mil headcounts. Feliz o líder que precisa de apenas um heartcount.

Somos todos visitantes deste tempo. Estamos só de passagem. Nosso objetivo é observar, crescer e amar. E depois, vamos para casa (provérbio aborígene).

Alberto Roitman é Chief Chaotic Officer da Escola do Caos, autor dos livros Você é o que Você entrega e A Última Chance. Podcaster no Caos Corporativo (Spotify) e sócio do Armazém.

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