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Aprendizados da liderança: conheça as histórias e ensinamentos de quem chegou lá e continua aprendendo com os próprios erros

Errar é humano, já diz o ditado. Mas a verdade é que não costumamos lidar bem com os nossos tropeços. Pelo menos não na hora em que acontecem. E os líderes, como será que lidam com o erro? Essa é uma boa pergunta, pois nos acostumamos a pensar que eles devem ser inspiradores, apontar caminhos e engajar seus times, ser super-heróis e super-heroínas acima da média e blindados ao erro.  

Mas será que eles não falham mesmo? Gestores ouvidos pela Revista Caótica mostram que a vida real de qualquer liderança inclui erros, sim, e que o mais importante de tudo é aprender rápido as lições que surgem a partir deles. 

“O ideal era não ter erro mesmo, mas só não erra quem não faz. Então, a primeira coisa fundamental no líder é que ele tome decisões, que faça e realize. Portanto, a tendência é de que vai errar no caminho. Não é que é bom o erro para aprender com ele, porém, se acontecer, o mais importante é que a gente tenha erros inéditos”, destaca Leonel Andrade Neto, que atuou por mais de três décadas em comitês executivos e boards de empresas e como CEO em grandes organizações. 

Para ele, alguns erros são considerados proibidos: “Não pode haver erro pautado na falta de ética, na displicência ou na falta de responsabilidade”. O CEO da S2 Holding, Thomas Simon, também diz que erros são fundamentais, mas afirma que não pode ser um errar por falta de conhecimento ou técnica.  

Thomas tem um lembrete que fica logo atrás de sua mesa que diz o seguinte: “Tudo bem fracassar, se o time está tentando coisas novas”. Neste caso, um erro seria chamado de experimentação e aprender com experimentos é um processo essencial para o crescimento de uma companhia. Já as falhas ocorridas por falta de atenção ou de treinamento seriam um erro. Saber a diferença é a base de tudo.  

“O espaço para explorar o novo, para errar, faz parte de um conjunto maior. Está nesse contexto mais amplo, no qual as pessoas se sentem seguras e têm clareza sobre o que é falta de disciplina e o que é ok em testar o novo. Esse diálogo a gente começou a ter aqui na empresa”, informa Thomas. 

Em uma empresa de origem familiar, ele percebe que as pessoas esperam decisões vindas de cima para baixo e ficam mais reticentes em propor mudanças ou apresentar soluções. Uma estratégia adotada pelo executivo é abrir a agenda para conversar, seja com gestores ou liderados. São cafés da manhã com quem se candidata a discutir temas absolutamente livres. 

“Tem sido recorrente, nessas conversas, esse processo de dar verdadeiro empoderamento para as pessoas, porque, se não se sentem empoderadas, ficam estáticas. Imagina, então, ousar”, comenta Thomas. 

A S2 Holding realizou, com a Escola do Caos, um trabalho para auxiliar na criação de um ambiente de segurança psicológica, onde a confiança esteja no centro, os colaboradores se sintam confortáveis e as decisões possam ser “empurradas para baixo”, como destaca o CEO. 

Esta alteração na rota já apresentou resultados bastante positivos na Black Friday do último ano, conta o CEO. Um de seus colaboradores apresentou uma ideia que foi bem estudada antes de ser colocada em prática. Ela poderia parecer simples, a princípio, ou ganhar um selo de erro, dependendo do que fosse decorrer da ação. O foco era o tempo para a entrega das encomendas na casa dos clientes.   

“A diretoria comercial reconheceu um rapaz que foi atrás de uma outra franquia dos Correios que fazia a operação de forma mais rápida e mais barata, e teve a coragem de propor a troca. Com isso, ele reduziu o preço do frete em quase 20% e melhorou o SLA de entrega (compromisso de entrega) que era em torno de 85% para algo em torno de 91%”.  

O CEO explica que houve diversas conversações até chegarem ao modelo que consideraram adequado para implementar a proposta. Uma das primeiras decisões foi optar por um teste em setembro para uma região específica do país. “Pensamos, vamos testar algo novo na Black Friday e colocar tudo em risco? Vale a pena? E decidimos por setembro porque, se desse errado, o volume de vendas seria infinitamente menor”. 

Segundo Thomas, esse ambiente estimula a discussão, estimula as pessoas a apresentarem os seus pontos de vista e a entenderem o porquê de suas missões: “Temos 3 mil colaboradores e a gente diz muito isso aqui: você pode trabalhar, tratar todos como um par de braços e um par de pernas, ou você pode explicar sempre o porquê da missão. Dá mais trabalho, sem dúvida, mas quando as pessoas entendem que elas têm como contribuir com solução, algo absolutamente extraordinário acontece”.  

Líderes e liderados precisam estar alinhados e caminhar juntos, afinal, a falta de confiança é um problema que coloca em xeque qualquer trabalho desenvolvido na companhia. Este problema está na lista dos principais erros, na avaliação de Curt Zimmermann, CEO do Banco Next. Ele, inclusive, afirma ter presenciado vários exemplos de falta de confiança de times em seus gestores e as consequências disso. 

“Isto castiga muito. Equipe e líderes são uma coisa só. Um organismo. Precisa funcionar coeso, alinhado e buscando o mesmo fim. Sem confiança, isto não se estabelece. Portanto, a primeira coisa que sempre faço é estabelecer esta relação. É a base fundamental para qualquer equipe funcionar”. 

Leonel Andrade também concorda e diz que a base de tudo pode estar relacionada a outro erro: não buscar a fundo saber quem são seus liderados. Para Leonel, esse é quase um pecado capital e o caminho para evitá-lo é se dedicar às pessoas e buscar um diálogo franco e interessado.   

“São poucos os líderes que batem papo. Quero dizer com isso que não importa em que nível estejam de liderança, tem que ter o hábito de se dedicar, pelo menos, 30 minutos por dia a conhecer as pessoas que trabalham com você. E não é somente conhecer na performance, no formal, é conhecer sonhos, vontades, hábitos, ansiedades, saber o que a pessoa quer da vida”, ensina. 

E foi devido à confiança que ele aprendeu uma grande lição quando assumiu uma de suas primeiras lideranças. Leonel atuava como gerente júnior de banco e concedeu um empréstimo a um cliente. Sua chefia imediatamente alertou sobre o risco de calote, mas já era tarde. 

“Ele falou que a gente não ia receber esse dinheiro de volta e explicou as razões. E respondi: por que você deixou que eu fizesse? Porque era o treinamento mais barato que eu podia ter, respondeu. Perdemos o dinheiro e eu aprendi um bocado. Então, acho que essa é uma lição de muita confiança mútua”.

Já no ranking de Curt Zimmermann, constam ainda outros grandes erros cometidos pelas lideranças: 

Não estar focado no resultado e nas capacitações necessárias para atingi-lo 

Ele comenta: “Desvio de foco pode ser um enorme detrator da gestão e levar ao insucesso rápido. A equipe tem que, primeiro de tudo, entregar aquilo ao que ela se destina a fazer. Já vi grandes gestores sucumbirem por falta de foco. O gestor não existe sem a equipe, não performa sem ela. Ela é o motor principal desta entrega”. 

Não se preocupar com o desenvolvimento da equipe e nem propor incentivos aos colaboradores 

Para ele, vale a máxima: pessoas certas no lugar certo, mas com um ingrediente a mais.

“Eu adicionaria: com os incentivos certos. Boas pessoas, nos lugares onde melhor performam, podem não sair do lugar sem os incentivos corretos. Mas é claro que sem as pessoas certas, ou mesmo elas nos lugares errados, a empresa também não se sustenta”, alerta Curt. 

Não se acomode e nem deixe que isso ocorra com seus times  

A busca constante pela excelência e por resultados melhores deve ser sempre norteadora para líderes e seus colaboradores.  

“Acomodação no mundo de hoje talvez seja a maior armadilha. Empresas bem-sucedidas têm o vício de olhar para trás e se vangloriarem das conquistas. Podem até fazer, mas dois minutos depois têm que levantar e correr atrás do novo objetivo, mais desafiador, e que nunca foi feito antes. Times acomodados falham brutalmente no tempo”, finaliza o CEO do Banco Next. 

E que tal esse? 

“A liderança, muitas vezes, não conhece o time, porque tem um problema de gestão de tempo, gestão de atividades, e é natural que, muitas vezes, o líder, quando foi promovido, não saiba que a vida dele precisa ser muito mais focada na gestão de pessoas do que na gestão da atividade em si”, ensina o sócio da Escola do Caos, Alberto Roitman. 

Por isso, alguns gestores acabam se confundindo e encarando desafios enormes para desempenhar suas funções e chegar aos resultados esperados.  

“Os líderes da atualidade acham que o que se espera deles é que eles tenham inúmeras reuniões, estejam envolvidos em muitos projetos, quando deveriam dedicar muito mais tempo para fazer gestão de pessoas. E é muito característica da cultura latina, de tentar justificar o tempo todo o porquê você virou líder”, avalia Alberto. 

Comunicação 

Além da gestão de tempo, a comunicação também faz parte do ranking dos principais desafios das lideranças atualmente, na avaliação de Tom Mendes, diretor financeiro do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR). Para ele, esses dois estão entre os pontos nos quais os líderes mais tropeçam. E, de brinde, podem levar, consequentemente, a problemas de delegação de tarefas e feedback insuficiente, adverte ele. 

“A gestão do tempo é fundamental. Tem que entender o que é prioridade. Quando você está na liderança, as informações chegam, as oportunidades e os problemas também chegam para você. E há uma tendência de a gente querer fazer o que é mais rentável no curto prazo. Isso é um perigo. Se você tem uma liderança que está desesperada, uma liderança que está nervosa, isso respinga e multiplica dentro da própria equipe”. 

E, como liderança negra, Tom traz à tona outro ponto importante em relação à comunicação: ela precisa ser ainda mais assertiva e muito bem colocada. “Há uma tendência de um descredenciamento. Estudos falam sobre isso de forma geral. Então, principalmente para pessoas negras, a observação tem que ser ainda maior porque o nível de exigência vai ser ainda maior, como se não pudessem nunca errar”.  

E qual erro marcou a trajetória dele? “Delegar no momento errado. Você precisa entender o timing. Eu acho que essa passagem de bastão tem que ser gradual, entendendo o ritmo das outras pessoas”.  

Ouvir demais também é considerado, por ele, outro erro pelo qual passou. “Porque, quando você está na liderança, está ali para decidir. Você ouve várias pessoas e toma uma decisão. Mas quando escuta gente demais, normalmente a tua decisão não vem de você. Então, quando você quer agradar muito, acaba não tomando uma decisão que é assertiva pra você”.  

Atenção, mais desafios à frente   

Quem faz parte da área de gente e gestão se depara com inúmeros desafios ao longo da carreira e diversos aprendizados, que ajudam na tomada de decisões.  

A diretora executiva da Camil Alimentos, Erika Magalhães, elenca nesta lista um desafio e tanto: aprender a lidar com as mudanças organizacionais, como reestruturações, fusões ou aquisições, sem deixar de manter as pessoas engajadas. 

Também faz parte dos desafios: “Ter ainda uma área de gente e gestão alinhada com a estratégia da empresa, atuando em várias frentes e desenvolvendo pessoas com programas eficazes de desenvolvimento de liderança para garantir que os gestores tenham as habilidades necessárias para liderar equipes de alta performance de maneira alinhada aos valores corporativos”, ressalta a executiva.  

Já pensar em desafios sem uma agenda efetiva de ESG, e principalmente de diversidade e inclusão, pode se transformar em um grande erro de liderança, alerta a executiva. Nesse quesito, ela chama atenção para outros pontos importantes, como a igualdade de oportunidades, equidade salarial e inclusão, diversidade geracional e as questões relacionadas à saúde mental e ao bem-estar dos funcionários.  

“Liderar em RH requer uma abordagem equilibrada, integrando habilidades interpessoais, conhecimento técnico e uma compreensão profunda das dinâmicas organizacionais. Adaptar-se a mudanças rápidas e complexas é uma parte essencial do papel de liderança em recursos humanos”, avalia Erika. 

E, como ninguém está imune a erros, Erika, que tem mais de 25 anos de atuação em RH, com passagens por empresas de diversos segmentos (como Ambev, Noble Group, Libra, Allied, YDUQS), conta que aprendeu muito com um equívoco cometido no início da carreira: “Não acertamos sempre. Um profissional precisa ser generoso consigo mesmo e entender isso, mas precisa também aprender com estes erros para não repeti-los”. 

Aliás, talvez você também já tenha passado por situações semelhantes à da executiva. Segundo ela, o problema ocorreu por achar que uma cultura que deu certo em um lugar poderia ser replicada integralmente em qualquer cenário, local e circunstância.  

Ela tem na ponta da língua o ensinamento que ficou: “Uma cultura pode servir de exemplo, mas, antes de querer impor, um profissional precisa avaliar o cenário em que está inserido, conversar com seus interlocutores, gerar relações de convergência e confiança, para fazer a transformação ou ajuste de rota que se faça necessário. É mais sobre alianças e menos sobre imposições”. 

Matéria da 9ª edição da Revista Caótica. Clique aqui e acesse a publicação completa. 

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